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USINA DE DESSALINIZAÇÃO DE FORTALEZA: O RACIONAMENTO DA RACIONALIDADE

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*Artigo de JOSUÉ FREITAS, Ambientalista e Consultor em Recursos Hídricos

Não há divergências quanto à importância da construção de uma Usina de Dessalinização de água marinha na Praia do Futuro, por parte das Empresas de Telecomunicações e Anatel. A única discordância é acerca da Planta no terreno atual, visto que, grandes dutos de água, pressurizados, ficarão sobrepostos a vários cabos submarinos intercontinentais de fibra óptica. As consequências da construção, operação e manutenção da Usina vêm causando insegurança nos investidores do Parque Tecnológico compreendido nessa área, prejudicando sua expansão e gerando impactos econômicos consideráveis às telecomunicações e, por conseguinte, à sociedade.

Não é razoável que por causa de um local de 25.000m², no contexto de uma orla de 34Km, sendo 8Km só na Praia do Futuro, se fomente a narrativa de que caso a Usina não seja construída, tão somente nesse local, poderá haver um colapso ou, no melhor dos cenários, racionamento no abastecimento de água em Fortaleza. Vale destacar que esse local, além de incompatível com a vocação turística da área, não é tecnicamente ideal, pois, trata-se de uma área residencial, com terreno elevado em relação ao nível do mar, o que demandará alto consumo energético na captação da água, sem espaço para expansão e dentro do Parque Tecnológico – PARQFOR, criado pela Lei Complementar Municipal Nº 205/2015.

No que pese a sua relevância, é um equívoco atribuir à Usina, que já perdeu o brilho do seu ineditismo, o status igual ou maior do que grandes obras públicas estruturantes de infraestrutura hídrica, como a transposição do rio São Francisco, o Eixão das Águas, o Cinturão das Águas e o Projeto Malha D’água. Trata-se de um empreendimento privado, contratado na modalidade PPP, para esporadicamente fornecer água a nove bairros que passarão a receber um tipo de água mais cara, paga por todos os fortalezenses.

Considerando fatores relevantes da conjuntura atual relacionados à segurança hídrica, tais como: a redução da população e do consumo per capta de água; a alta capacidade de produção das ETAs Gavião e Oeste de 13,5m³/s, com vazão média e estável de 8m³/s para o macrossistema de distribuição, ou seja, operando com 69% da capacidade; a redução do consumo de água do açude Castanhão pelo Complexo
Portuário do Pecém; a boa reserva dos açudes e a disponibilidade das águas do rio São Francisco, podemos afirmar que não é plausível a ameaça de racionamento em Fortaleza, apesar das preocupações com as mudanças climáticas.

Nesse contexto, vale destacar a redução da dependência do Complexo Industrial e Portuário do Pecém – CIPP das águas do açude Castanhão nos últimos 5 anos. Lembrando que o CIPP já demandou quase o corresponde a 30% do volume de água transferido do Castanhão para Fortaleza. Hoje, 90% das águas que abastecem o CIPP saem do açude Sítios Novos (Caucaia). Dos 2m²/s de água outorgados pela COGERH para o consumo das empresas, apenas a metade vem sendo utilizada. A política de reuso da Siderúrgica, maior consumidora, e as duas Usinas Termoelétricas, sem geração há mais de 2 anos, têm contribuído para essa redução significativa. Ressalte-se que os 47 poços profundos instalados no município de São Gonçalo do Amarante, operados pela COGERH, com volume anual de 4,5 milhões de m³ disponíveis para atender o CIPP não estão sendo utilizados.

Diante dessa nova realidade, é provável que a tendência do Complexo seja reduzir ainda mais sua dependência das fontes de água compartilhada com a sociedade, ainda mais se considerarmos os investimentos em Usinas de Dessalinização de água marinha por parte das empresas que produzirão Hidrogênio Verde.

Em qualquer território do mundo suscetível à escassez de água em razão das características climáticas, como é o caso do semiárido brasileiro, uma Usina de Dessalinização pode ser um equipamento
importantíssimo, desde que devidamente contextualizada, justificada social, ambiental e economicamente e situada adequadamente no tempo e no espaço.

Entretanto, no cenário atual, para cada mil litros de água da Usina injetada na rede, deve-se perder quase a metade, então, o incremento de 12% (1m³/s) a mais para o consumidor, como tem sido propagado, é
uma peça de ficção. Para alcançar essa cota, seriam necessárias duas Usinas do mesmo porte. Realmente, injetar 1m³/s de água na rede para perder quase a metade não é racional. Hoje, em Fortaleza, o índice de perdas totais de água na distribuição é de 46%.

Vale destacar que, embora esse volume (1m³) não chegue integralmente na casa das famílias, o valor por esses mil litros terá que ser pago às empresas proprietárias da Usina, assim como, independente de fornecer água ou não para a população a CAGECE terá que pagar, com recursos oriundos do pagamento das contas de água da população, uma parcela fixa pela contratação da Usina no valor de R$ 5.312.951,00, mensalmente, durante 30 anos.

A água dessalinizada é mais cara do que a água doce que já recebemos hoje e por isso, forçará o aumento da tarifa. Lembrando que neste mês de outubro tivemos um reajuste de 14,39% na tarifa de água, o que é bastante considerável. A maioria dos países que consomem água dessalinizada tem elevada renda per capita e alto poder aquisitivo (EUA, Canadá, Austrália, Israel etc.).

Com relação ao local da construção da Usina que está posto no Projeto, penso que, ao invés de apenas afastar os dutos de água dos cabos no mar (500m), colocando a câmara de captação de água junto a esses dutos no terreno em frente à praia, na Av. Zezé Diogo (Praia do Futuro), o Consórcio responsável pela Usina e a CAGECE deveriam transferir também a Planta para as imediações dessa área, integrando-a ao sistema de captação.

Essa mudança evitaria o aumento dos custos da obra em R$ 35 milhões alegado pela CAGECE, geraria economia na construção e operação (menor consumo energético), não acarretaria novos estudos dos ambientes marinho e terrestre, garantiria o sossego das comunidades no entorno do empreendimento e principalmente, resolveria o impasse com as empresas de telecomunicações do Parque Tecnológico.

A sustentabilidade de água em Fortaleza passa por soluções mais simples e menos onerosas, como a redução de 10% das perdas até 2033, para garantia da oferta até 2048, conforme estudos da própria CAGECE, associada ao reuso do efluente da Estação de Esgoto da CAGECE – EPC (Av. Leste-Oeste), que descarta 4,8 m³/s (equivalente a cinco Usinas) de água no mar, não para transportá-lo até o Pecém, mas para múltiplos usos em Fortaleza e RMF, preservando a água potável para o consumo humano.

Por fim, para reduzir também as perdas de água por evaporação, uma estratégia eficiente seria a implantação de usinas solares fotovoltaicas flutuantes em açudes e canais de irrigação, cobrindo parte da superfície da água. Com isso, teríamos mais água e energia para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico no interior do estado. Nesse ínterim, os governantes deveriam promover campanhas educativas para o uso racional e consciente da água.

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