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USINA DE DESSALINIZAÇÃO: UM DIVISOR DE ÁGUAS PARA FORTALEZA

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*Artigo de JOSUÉ FREITAS, Ambientalista e Consultor em Recursos Hídricos

Muitos fortalezenses devem estar se perguntando o que será essa Usina de Dessalinização na Praia do Futuro.
A dessalinização de água marinha consiste em retirar os sais em excesso da água e torná-la potável, nesse caso,
através da tecnologia Osmose Reversa. Alguns países do mundo já fazem dessalinização desde a década de 70,
como por exemplo Israel, onde chove muito pouco (500mm/ano), tem 60% do território deserto, já saturou sua
capacidade de reuso de efluentes (86%), tem perdas de água de apenas 5% e as fontes de água doce não suprem
mais as necessidades de consumo da população e das atividades econômicas.


Em regra, essas Usinas não são construídas em áreas residenciais, mas no caso de Fortaleza, pretendem
construí-la na Praia do Futuro, principal cartão postal da cidade que tem o turismo como principal ativo econômico.


A primeira constatação sobre possíveis riscos de a Usina afetar os cabos de fibras óticas foi feita em 2018 pelo
Consórcio liderado pela Empresa GS Inima, contratado pela CAGECE para elaborar os estudos da Usina. Na ocasião,
foi analisada na Praia do Futuro a área 5 (Av. Dr. Aldy Mentor) e considerada tecnicamente inviável, principalmente
pelos prováveis cruzamentos dos dutos de água (captação e emissário da salmoura) com cabos submarinos de
fibras óticas. Na ocasião, os estudos concluíram que a área 03 (Mucuripe – Praia Mansa) seria o local mais viável
para instalação da Planta, porém, essa escolha não foi aceita pela CAGECE.


Como alternativa, ainda na Praia do Futuro, a CAGECE indicou a área atual, porém, surpreendentemente,
aproximando a Planta ainda mais dos cabos em relação à área 5 (distante 3km da área atual), com cruzamentos
diretos no mar e na terra, colocando a Planta a apenas 50m de distância do Data Center da TelCables (Angola
Cables) que recepciona 17 cabos de fibra ótica submarinos, elevando bastante as possíveis interferências. O Projeto
Referencial atualizado registrou a escolha e reafirmou as possíveis interferências com os cabos também nessa área.


Somente em 2022, um ano após a assinatura do Contrato de Parceria com o Consórcio vencedor da licitação,
e após ter tido o Pedido de Autorização de Obra negado pela Superintendências do Patrimônio da União – SPU/CE,
a CAGECE reconheceu os riscos de colisão dos dutos de água no mar com os cabos e alterou o Projeto. Essa
alteração afastou os dutos de água no mar, reposicionando-os a uma distância de 500m do último cabo ótico
instalado, atendendo parcialmente às diretrizes do International Cable Protection Committee (ICPC). No entanto,
manteve a Planta no mesmo lugar e com os dutos da captação e de lançamento da salmoura cruzando com muita
proximidade pelo menos 4 cabos óticos na entrada da Planta. Tal alteração foi considerada insatisfatória pelas
empresas de telecomunicações, o que manteve o impasse que estamos presenciando.


Destaque-se que, quando a Praia do Futuro foi escolhida para a instalação do Hub de Telecomunicações e do
Parque Tecnológico – PARQFOR (Lei Complementar Municipal Nº 205/2015), não havia previsão para instalação
nessa área de nenhum empreendimento industrial de grande porte como é uma Usina de Dessalinização. A rota
dos cabos submarinos foi selecionada visando obter tanto a proteção do cabo a longo prazo (25 anos) quanto evitar
a menor interferência possível com outras infraestruturas ao longo de todo seu trajeto. Para tanto, foi feito um
mapeamento prévio das infraestruturas subterrâneas em terra (redes de água, esgoto, drenagem, gás etc.), pois
os cabos são projetados para atender as especificidades da rota selecionada de acordo com a profundidade, tipo
de leito oceânico e o local de instalação, visando uma convivência segura com outras infraestruturas já existentes
ao longo da rota, no mar e na terra.

Além disso, a definição do local de chegada dos cabos na costa obedece a critérios técnicos previamente
estabelecidos, como a disponibilidade de terrenos para instalação de estações de conexão, acessibilidade (vias
terrestres), possibilidade de conexão com infraestrutura de telecomunicações existentes e proximidade da estação
terminal terrestre (Data Center) que deve estar localizada dentro do raio de 5 km da estação de conexão etc.

Para exemplificar a importância da Praia do Futuro para esse ecossistema digital, destacamos a presença do
Data Center AngoNAP da TelCables Brasil, provedora de serviços de rede e soluções digitais e operadora local da
Angola Cables, multinacional de TIC classificada como a operadora número 33 do Mundo. A Angola Cables gerencia
o PIX que hoje já é o segundo com mais tráfego de dados do Brasil. Por meio de redes próprias de cabos submarinos
de alta capacidade, a Angola Cables se conecta diretamente às Américas, África, Europa e Ásia, além de estar ligado
a mais de 66 Data Centers Mundiais.


Vale ressaltar que esses sistemas de cabos óticos submarinos são imprescindíveis para o país, contribuindo
para aceleração do desenvolvimento econômico e social e da redução das desigualdades regionais, ampliando a
oferta e uso das redes de telecomunicações em todo o território nacional e gerando desenvolvimento industrial e
tecnológico. Por sua importância estratégica, são consideradas pela União infraestruturas críticas e, portanto,
protegidos pela Lei de Segurança Nacional.


Diante desse cenário de instabilidade, a Anatel, no seu papel institucional enquanto Agência Reguladora das
telecomunicações no Brasil, vem tentando sensibilizar e alertar as autoridades governamentais nas esferas federal,
estadual e municipal, desde 2021, para potenciais impactos e consequências que a Usina poderá trazer ao sistema
global de telecomunicações. As últimas tentativas se deram por ocasião da Audiência Pública para apresentação
do EIA/RIMA da Usina, realizada pela SEMACE na Praia do Futuro no dia 25 de agosto de 2023 e o Seminário
Conexões Políticas: A Importância dos Cabos Submarinos, realizado nos dias 25 e 26 de setembro, em Fortaleza.


Com relação à necessidade urgente da construção da Usina pelo suposto risco de faltar água em Fortaleza,
entendo que a urgência maior seria o controle de perdas de água que hoje é de 46,71% e não é só perda de água,
mas também de faturamento e isso tem prejudicado bastante o abastecimento.


Nessas circunstâncias, a Usina pretende injetar 1m³ de água na rede para perder quase a metade, então, o
incremento de 12% na oferta cairá para 7%, apenas. Considerando também que para o consumo da população ela
vai funcionar apenas sob demanda, mas independente de fornecer água ou não, uma parcela fixa pela contratação
da obra terá que ser paga mensalmente durante 30 anos. Por ser mais cara, a água dessalinizada pode forçar um
aumento da tarifa e prejudicar camadas da população com baixo poder aquisitivo. A maioria dos países que
consomem água dessalinizada tem elevada renda per capita e alto poder aquisitivo (EUA, Canadá, Austrália, Israel
etc.).


Entretanto, para suportar as irregularidades de chuvas devido às mudanças climáticas, além de sua
infraestrutura hídrica robusta, o Ceará tem hoje as águas do rio São Francisco, disponíveis desde 2021 com volume
de 10m³/s, equivalente à produção de 10 usinas de dessalinização, com menor preço da água. Neste ano de 2023,
o estado não precisou bombear água do rio São Francisco devido à boa recarga dos açudes. Importante frisar que
não há aumento de demanda de água para o Complexo Industrial e Portuário do Pecém – CIPP, que compartilha
água do açude Castanhão com Fortaleza e, em breve, deverá receber Usinas de dessalinização para produção do
Hidrogênio Verde.


Portanto, nesse divisor de águas, não é justo colocar o fortalezense no dilema entre “falta de água” e falta de
internet. O setor de telecomunicações nunca foi contra a usina, apenas não concorda com o local onde se pretende
instalá-la, que de fato é preocupante. Por outro lado, é inacreditável que nos 34km de orla da cidade, sendo 8km
só na Praia do Futuro, não haja um local mais viável e seguro para a instalação dessa Usina (que precisa de apenas
25 mil m² de área) a fim de superar esse impasse e criar um ambiente de estabilidade e tranquilidade para todos,
pelo bem do desenvolvimento socioeconômico e o interesse público dos fortalezenses.

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