– Preciso vender dois com urgência. Cheio de conta aqui. -Quanto? – Tenho que vender! – 30, 35…? – VENDA! – Ok! Te ligo.
Esse diálogo poderia ser também de qualquer outro empresário para seus vendedores. Acontece que estamos falamos da indústria que mais emprega e que tem o maior peso na nossa combalida economia.
Pode existir um segmento do setor industrial tão sofrido quanto o setor da construção civil, mais que este não. Não existe. No chão desde 2015, a venda de imóveis não consegue decolar em face do alinhamento de planetas nocivos que o mais longo período de declínio da atividade econômica trouxe para a cena imobiliária. O time escalado com desemprego e incertezas no ataque, distratos e menor renda no meio de campo, crédito difícil e estoques elevados nas laterais e burocracias e custos na defesa, vem fazendo o setor imobiliário ser goleado pela crise. Até as empresas que apostaram na baixa renda, notadamente na construção de imóveis enquadrados nos parâmetros do Minha Casa Minha Vida (MCMV), viu seu fluxo de caixa derreter no cipoal dos cronogramas físicos realizados e cronogramas financeiros frustrados pelos atrasos dos repasses. Imóveis prontos e não pagos na baixa renda e imóveis prontos e não vendidos na média e alta renda fizeram as Incorporadoras e Construtoras entrarem em uma turbulência que fez os comandantes pousarem de emergência no aeroporto mais próximo, em face das avarias e feridos a bordo.
Os efeitos da quase total paralisação da indústria da construção civil, caracterizada pela enorme inclusão social pelo vetor do emprego, foi sentida fortemente por toda a economia em face do protagonismo na massa de empregos que o setor sustenta. Com a conta Imóveis a Comercializar abarrotada, incorporadoras/construtoras meteram o pé no freio e trataram de parar ou adiar novas obras, até mesmo aquelas relativas a empreendimentos já lançados e com vendas pífias. A ordem, óbvio, é sobreviver na travessia do deserto de dimensões saarianas imposta pelo mais cruel contexto de adversidades inaugurado no final da primeira metade desta década.
Os números dos flashes imobiliários divulgados mensalmente revelam que, não obstante o acender da esperança, os estoques atuais levarão em média quatro anos para serem vendidos, isso se não acontecerem mais lançamentos de imóveis com o perfil de preço, padrão e público iguais aos hoje hiper ofertados. Doravante, somente imóveis direcionados para públicos que demandam tamanhos e preços menores, afinal 90% das simulações de financiamentos imobiliários realizados nos sites dos Bancos são para financiamentos de até R$ 500.000,00. Lançamento de prédio comercial virou palavrão e quem os detêm levarão mais tempo ainda para colocá-los no mercado. Outra constatação é de que tabela de preço de construtoras assumiu o papel de mero referencial no dificultoso processo de negociação com os clientes, que chegam a arrancar até 42% de desconto no valor net.
Para complicar ainda mais a vida dessa Indústria existe a concorrência feroz dos investidores que também estão na tentativa de converter seus ativos imobiliários em ativos financeiros, em face da baixa liquidez que a crise impôs para imóveis voltados a classe média e alta, assim como das salas comerciais e lajes corporativas. Sejam os pequenos investidores ou os fundos imobiliários, carregar esses imóveis em carteira está cada vez mais oneroso e prejudicial para as taxas de retornos projetadas no passado. A ordem é vender, mesmo que a preços menores dos que praticados pelas incorporadoras.
Outra variável dessa complexa equação imobiliária que, segundo muitos já é uma constante, é a conduta de uma nova geração que não elege mais a “casa própria” como um sonho de consumo. O novo conceito não passa mais por possuir um imóvel, mas sim por morar bem. Esse conceito de morar bem nada tem a ver com o fato de existir ou não uma escritura no nome de quem usufrui daquele imóvel. Assim, como o trabalho, os imóveis também deixaram de ser um vínculo para toda a vida.
Mesmo nesse novo contexto percebe-se, finalmente, a luz acesa no fim do túnel, contudo, esse túnel é extenso e quem já chegou até aqui tem sim chances de sobreviver. Porém, é entendimento pacífico, nos debates dos grandes analistas do setor, que o futuro jamais será como antes.